Faz ao menos dois anos - desde que abri mão de um emprego de sonho por achar que não valia a pena sair daqui - que eu me faço esta pergunta quase que diariamente. Ainda mais agora, com dois grandes amigos se bandeando para São Paulo, repetindo o trajeto que meu pai fez conosco em 1980, e o Márcio e eu fizemos em 2001. É uma pergunta plausível, já que não podemos deixar de levar em consideração o oceano de oportunidades profissionais que, na comparação, São Paulo evidentemente oferece para quem escolheu a comunicação como meio de ganhar a vida - algo que o Márcio e eu fomos doidos o bastante para fazer. O fato é que ao me perguntar "por que ficar em Porto Alegre", quase sempre encontro muitas respostas. Elas quase nunca parecem suficientes, mas via de regra justificam a resistência em ir embora.
A Porto Alegre que vivo no cotidiano não tem trânsito caótico, já que moro na Zona Sul e não trabalho necessariamente nos horários de pico - exceção agora às quintas à noite, quando preciso ir à Unisinos, em São Leopoldo, e levo uma hora e meia para percorrer um trajeto de pouco mais de 40 quilômetros, o que ainda não me parece assim tão absurdo depois do ano e meio passado em São Paulo entre 2001 e 2003. A minha Porto Alegre tem uma vista diária do Guaíba, a partir da sacada do meu quarto ou da vaga em que estaciono o carro no meu condomínio. Tem também os cafés que frequento que não pertencem a uma grande rede de franquia e têm cada um a sua especificidade - e proprietários que nos conhecem pelo nome e sabem o que a gente quer.
A minha cidade tem um centro tido por muitos como medonho, mas onde sou capaz de encontrar pequenos oásis de cultura e gastronomia que amenizam o choque da pobreza inevitável dos centros de cidade que não passaram ainda por um projeto eficaz de revitalização. Mais do que tudo, a província tem um céu azul que segue azul até o horizonte. Ah, sim, e tem horizonte também. Porque tem um rio - que agora virou lago, mas para mim seguirá sendo rio - que nos permite ter um pôr-do-sol bem bacana.
A Porto Alegre da qual não quero sair tem boa oferta cultural - entre livrarias, teatros e cinemas -, além de banda larga e tv por assinatura, que me permitem estar totalmente inserida na tal da aldeia global. Em termos gastronômicos, tem restaurantes razoáveis e, de uns tempos para cá, pouquíssimos são os ingredientes impossíveis de se encontrar. Virou moda em São Paulo? Pode contar que já está em alguma das delicatessens locais. Ou no mercado público.
Como cereja do bolo, a cidade tem a minha família, além de bons e queridos amigos. E um aeroporto com voos que me levam, em menos de duas horas de viagem, a cidades incríveis como Buenos Aires, São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis, Montevidéu. De carro, estou a duas horas de Gramado e Canela e seus deliciosos restaurantes, a pouco mais do que isso de um paraíso como Itaimbezinho e a pouco mais de duas horas de praias bacanas - de Torres para cima, evidentemente, que não cheguei ao ponto de me ufanar "da maior praia do mundo". E se não vou mais seguido a esses lugares, a culpa é minha, não de Porto Alegre.
Claro que a minha cidade tem coisas absolutamente irritantes, capazes de levar qualquer ser humano à loucura, como, por exemplo, um bairrismo exacerbado que insiste em ter "o maior", "o melhor", "o primeiro", "o mais importante", "ó único" qualquer coisa. Um orgulho bobo de coisas falsas que só fazem com que os forasteiros tenham vontade de rir da gente.
Essas coisas irritantes, porém, seriam as respostas para a pergunta "por que deixar Porto Alegre", não? E, no momento, não tenho por que fazer essa pergunta. Assim, enquanto essa necessidade não chega - se é que chegará um dia -, sigo insistindo na vidinha para qual escolhemos voltar em 2003, depois de um longo processo de listar prós e contras.
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Este post foi inspirado por este da Carol Bensimon, que, vejam só, teve a "infelicidade" de ter deixado a província por Paris.