O dia se espatifa: 2015

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

A vida em uma música

A ciência já deve explicar, mas a mim falta o conhecimento para compreender o que torna um momento indelével em nossa memória. Um cheiro. Um sabor. O gesto ou o olhar de alguém. Às vezes, como ocorreu ontem, algo que já estava impresso nas nossas lembranças afetivas ganha, subitamente, um significado muito maior.

Renato Borghetti, o músico, faz parte da minha vida há pelo menos 30 anos, quando meu pai chegou de viagem a Porto Alegre com uma fita cassete de um guri virtuose na gaita ponto. Eu tinha 11 anos, mas entendi imediatamente que ali estava algo muito especial. Borghettinho nunca mais saiu da trilha sonora da minha vida.

Nos últimos dois anos, porém, ele invadiu a minha casa, enquanto o pai da minha filha escrevia a biografia dele, muitas vezes ao som de suas músicas. A tal ponto que nossa pequena é capaz de reconhecer "o tio Boguéti" ao primeiro acorde de uma peça. E ele passou a ser de carne osso, assim como a família linda e colorida que construiu no caminho. Linda e colorida de verdade. E eu agradeço ter sido recebida no meio deles nesta carona que me deu o Márcio.

Nesse período, fiquei particularmente encantada pela interpretação dele de Barra do Ribeiro, uma música linda, linda, linda. Porque melancólica, alegre, tranquila, agitada, tensa. Em alguns momentos, ela parece ter terminado, numa nota triste, desesperançosa, para em seguida retomar o caminho possibilidades acima.  Não sou crítica de música, e posso estar escrevendo muita bobagem, mas essa execução de Barra do Ribeiro me faz sentir tudo isso. Me faz acreditar que dá sempre pra seguir em frente, que as coisas boas vêm e vão, assim como as ruins. Só não se pode desistir de tocar.

Obrigada, Renato, Pedrinho, Daniel e Vitor. O que vocês fizeram ontem naquele palco do São Pedro com esta música criou uma lembrança que vou levar para todo o sempre. Eu chorei muitas lágrimas. De tristeza, de saudade, de melancolia, de mágoa, mas também de alegria, de esperança nas possibilidades, de gratidão e de perdão. Todas essas coisas de que é feita a vida. Obrigada. A noite toda foi linda, mas vai ser aquela música que vai ficar marcada para sempre na minha memória. E esta lembrança vai estar comigo a cada novo passo da minha nova jornada.

 

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Meu pai e uma fita K7

Faz mais de 30 anos, e eu me lembro como se fosse hoje do meu pai chegando em casa de uma viagem a Porto Alegre (morávamos em Sorocaba) com uma fita K7 com um gaiteiro cabeludo na capa. "Esse guri é incrível!" E aquela fita K7 não saía do toca-fitas do carro dele. E eu me lembro que às vezes ele enchia os olhos de lágrimas ouvindo o guri tocando tão lindamente, principalmente nas férias, quando estávamos na estrada que ligava São Paulo a Porto Alegre.
Eu me lembro que quando conheceu o Márcio, há quase 20 anos, meu pai disse que gostou do guri (algo que ele nunca havia dito sobre os carinhas que eu apresentava pra ele). Se não tivesse morrido poucos meses depois de conhecer o pai da neta dele, meu pai provavelmente estaria orgulhoso do livro que o genro dele escreveu sobre a vida do cabeludo virtuose da nossa fita K7.
Ontem, no Ocidente, vendo aqueles quatro músicos fantásticos tocando com tanta energia boa (porque o cabeludo não apenas toca muita gaita, como é cercado de pessoas incríveis), fui eu que enchi os olhos de lágrimas pensando nisso tudo.


segunda-feira, 9 de março de 2015

Desenhando...

Vamos deixar uma coisa estabelecida neste começo de semana?
Dentro do cenário político brasileiro existem muitas vertentes...
1 - Existe a situação democrática que defende o governo atual apesar de suas falhas e problemas — inerentes a qualquer governo democrático
2 - Existe a oposição democrática ao governo atual — onde me situo
3 - Existem os que são contra tudo isso que tá aí e estão sempre numa oposição cinzenta atirando pra qualquer lado de maneira inconsequente e adolescente
4 - Existem os que não sabem o que está acontecendo no mundo e replicam e repetem coisas que acham bacaninha aqui ou ali
5 - Existem os que não sabem o nome da presidente da república e não conseguem diferenciar um partido de um armário embutido
6 - Existem os cabeças de vento reacionários que defendem um golpe (confesso que não conheço pessoalmente nenhum, ou, se conheço, já deletei DA VIDA)
7 - E existem os cabeças de vento que tatuaram a estrela no peito e defendem o João Santana, ops, a Dilma e o projeto petista de poder com mentiras e argumentações que contrariam qualquer bom senso
Então, muito cuidado antes de chamar teu amigo do tipo 1 de petralha ou teu amigo do tipo 2 de coxinha golpista. Porque isso te aproxima muito, muito, muito dos itens 6 e 7 — que eu prefiro simplesmente ignorar.

sábado, 21 de fevereiro de 2015

Da autoimagem e do desserviço de alguns profissionais

Então eu deparo com a fan page de uma médica endocrinologista especializada em dietas de controle da obesidade. E o conteúdo todo da página é, evidentemente, sobre os malefícios da obesidade e os benefícios de uma dieta saudável. Nada a discutir aqui, não sou médica, mas apenas uma pessoa acima do peso (com o peso estável, diga-se) há mais de 15 anos que mantém obtendo resultados de exames saudáveis anualmente e se sente mal apenas quando fica muito tempo sem se mexer.

Dito isto, o que mais me irritou na página: as fotos "saudáveis" são TODAS de modelos lindíssimas (e macérrimas, e sou capaz de apostar várias provavelmente portadoras de distúrbios alimentares como anorexia e bulimia). Por que ignorar todo o oceano que existe entre a obesidade e os hábitos alimentares prejudiciais (quantas pessoas magras você conhece que sofrem com glicose e colesterol alto?) e não postar fotos de pessoas NORMAIS, com pesos NORMAIS, como exemplo de vida saudável?

Que feio profissionais de saúde contribuírem para essa maldita construção da imagem impossível que tanto prejudica a formação da autoconfiança das nossas crianças em relação a seus próprios corpos...

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

A eloquência do coração

Quando crianças, aprendemos a desenhar corações e descobrimos que eles significam amor. Com o passar do tempo, aprendemos que quem manda mesmo é a cabeça, que o coração não faz nada além de pulsar. Mais tarde na vida, percebemos que, mesmo que a cabeça mande, é o coração que salta de emoção, aperta de tristeza, dispara de excitação. É o máximo esse tal de coração.

Durante a vida, tem aqueles momentos em que dizer alguma coisa é muito pouco. Quando vemos uma foto de um bebê encantador que acaba de nascer, quando sabemos de alguém querido que perdeu alguém amado, quando queremos dizer que entendemos a dor/a alegria/a ansiedade de uma pessoa importante para nós e que a cercamos de carinho embora não saibamos muito bem como expressar em palavras.

Não, eu não sou adepta do coração com as mãozinhas unidas. Acho brega. Me julguem. Mas, no texto digital, ainda estão por inventar símbolo mais eloquente do que a sucessão do sinal de menor com o número 3. 

<3

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Viva o Papa Francisco! Pelo fim das igrejas!

Outro dia um amigo criticou o fato de o papa Francisco ser incensado por dizer apenas o óbvio. De fato, ele diz apenas o óbvio ululante do humanismo. Mas aí que tá a beleza da coisa. Quem foi criado na Igreja Católica como eu, em que as "catequistas" muitas vezes usavam frases como "porque é assim", "porque o divino espírito santo quis assim" ou "são os desígnios de deus" para explicar os questionamentos infantis, sabe o valor que é ter um sumo pontífice (que eu sempre achei que tivesse alguma coisa a ver com suco) que fale a nossa língua, que diga... o óbvio. 

Num mundo ideal, os papas Franciscos de cada religião destruiriam as tradições de suas instituições e as migrariam para uma filosofia de solidariedade ecumênica, em que todas as crenças fossem respeitadas igualmente (inclusive as não-crenças), e apenas uma lei seguisse valendo, com uma redação mais ampla: ama ao próximo como a ti mesmo e ao universo sobre todas as coisas.