O dia se espatifa: Do pessimismo como otimismo ao puro e simples otimismo

terça-feira, 18 de abril de 2006

Do pessimismo como otimismo ao puro e simples otimismo

Fiz dez anos de terapia. O diagnóstico todo da minha maluquice podia ser resumido como "sofrer por antecipação", um mal que me afligia desde a mais tenra infância. Já devo ter dito aqui, mas lembro como se fosse hoje de, aos 8 anos, não entender como os meus colegas de aula podiam brincar tão despreocupadamente na hora do recreio enquanto uma guerra comia solta logo ali, na Argentina.

Posso dizer que minha santa terapeuta – com a minha ajuda, claro – me salvou deste mal. Parei de sofrer por antecipação. O problema foi que, em compensação, eu parei de antecipar as coisas de um modo geral. Parei de esperar pelas coisas, de imaginar as coisas dando certo. Na verdade, passei a esperar o pior, porque daí, quando o pior não acontece, acabo me sentindo uma felizarda. De certa forma, tem funcionado.

Quando me envolvo em algum projeto pessoal, eu me empenho na realização dele, mas não idealizo nada. Busco o melhor possível, mas não o imagino pronto, e penso sempre no pior cenário possível, para não me frustrar com o resultado concreto. E a verdade é que, na maioria absoluta das vezes, acabo me surpreendendo positivamente com o resultado. Dei a isso o nome de "pessimismo otimista".

Eis que agora, com a acupuntura e a yoga me ajudando a mudar a minha forma de ver o mundo, estou sendo cada vez mais incitada a "gozar por antecipação", a visualizar o que quero como se a coisa estivesse pronta e acabada. Linda, perfeita e maravilhosa. Dizem que isso ajuda o nosso desejo a se concretizar. Só que o meu lado "analisada" ainda resiste. E se a coisa NÃO se concretizar?

O curioso é que profissionalmente eu já ajo dessa maneira. Sempre agi. Quando começo um novo trabalho, o que imagino pronto É o melhor possível. Felizmente, lá no fim da linha costumo realmente encontrar aquilo que idealizei. Pois hoje de manhã, no meio do relaxamento da aula de yoga, tive esse insight. Por que não repetir nos projetos pessoais o que faço nos profissionais?

Ãnfã (no feliz dizer dos franceses), não sei se vocês notaram, mas faz uns dias que troquei o meu motto ali de cima. Em vez de "Faça como eu digo, faça como eu faço, aja duas vezes antes de pensar", um verso da música que toquei quando fui receber o diploma na minha formatura. Porque ultimamente eu me flagrei várias vezes pensando antes de agir, sendo mais parecida com a adolescente cheia de sonhos que já fui. E isso parece estar fazendo de mim uma pessoa um pouco melhor.

E eu me dou conta de que talvez esses dez anos que separam a minha formatura (e a morte do meu pai) de hoje tenham sido necessários para eu fechar o ciclo do pessimismo como otimismo e passar ao ciclo – aparentemente mais maduro – do simples otimismo. Porque, afinal, se EU não acreditar que as coisas vão dar certo, quem mais vai?

Claro que tem um pedacinho de mim que ainda não entende como eu posso me divertir assistindo a uma comédia romântica enquanto aqui do lado tem criança se matando em briga de traficante, como posso dançar até cansar enquanto do outro lado do mundo guris se explodem em nome de uma causa que não compreendem muito bem e levam várias vidas junto com eles, como posso apreciar a leitura de um belo livro enquanto milhões de pessoas não têm sequer o que comer...

Claro que outro pedacinho de mim morre de medo de querer muito uma coisa e não conseguir e de acabar frustrada e se sentindo a última das criaturas, de se expor dessa maneira diante dos leitores que estão em muitos lugares, vários dos quais nem conheço – o alcance desse blog às vezes me assusta. Só que o que eu quero mesmo hoje é pedir licença, porque eu vou botar meu otimismo de novo em campo.

8 comentários:

  1. Coincidência das coincidências (ou não?), publiquei este post e li este outro da Bina. Pode parecer que não tem nada a ver, mas tem.

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  2. Cássia, simplesmente quando estou pensando assim, ou seja: ...como posso "estar" assim... ...se, outros "estão" assado..., sabes o que faço? Olho pra Mel, boto ela na coleira e a levo pra se divertir na praça. Volto de lá curado. Ela me cura!

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  3. Hehehe... e, "coincidências das coincidências", eu adotei o pessismo otimista há séculos, e também é um mal do qual tento me livrar... Será que devo fazer ioga tmb? :)
    beijo

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  4. engraçado... meus amigos dizem que sou uma otimista que chega a ser irritante de tão "feliz"... mas eu me considero mais uma "realista muito bem-humorada" do que otimista, embora meu temperamento seja o de ver a luz no fim do túnel... mas acho que é porque simplesmente não sei me pré-ocupar (e se até os 40 não aprendi, não é agora que vou começar) e nunca tive paciência pra ficar esperando o pior. Tento é não esperar nada e ir em frente. O que vem é lucro, e se nada vem... bom, quem é que tava esperando, mesmo? :)

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  5. Eva, o que tu faz é uma versão mais light do pessimismo otimista...

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  6. Valeu, mana.

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  7. Essas coisas de coincidência são um tanto estranhas, né...
    Tenho pensado muito em como levo a vida, e em como os outros vêem o modo que eu levo a vida. Uma das coisas que eu ouço demais é "você leva tudo muito a sério", porque me preocupo demais com tudo...
    Me senti você 10 anos atrás depois que terminei de ler. Nem sei de qual blog eu vim pra cair aqui, mas gostei muito. E agora vi que vc também é de PoA. :)
    Abraços

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